sábado, 23 de maio de 2009

Mulheres de Santo André

Hoje o dia foi inspirador. Eu conheci duas mulheres impressionantes. Vi por duas vezes olhos se enchendo de lágrimas involuntariamente. Uma delas, dona de um restaurante simples, na beira da praia, nada além do fogão à lenha e algumas cadeirinhas. Por lá, não há energia elétrica, ou melhor “não tem eletricidade, porque energia e luz tem muita”. Quem comanda as panelas de barro e não deixa o fogareiro apagar é Dona Maria Nilza. Ela própria compra os peixes e camarões direto dos pescadores. Esse foi o primeiro lugar que visitei aqui na Bahia que não serve camarões nos meses de defeso. “Para fazer isso, só se eu congelasse por muito tempo e tudo que eu uso é fresco.” Dona Nilza me mostrou com calma cada cantinho do restaurante, até o banheiro. Tudo muito simples, mas decorado com carinho, com toalhas coloridas de chita e teto de sapé. Quando eu elogiei o cafezinho passado na hora no fogão à lenha e servido com açúcar mascavo, ela me disse que o segredo era fazer as coisas com amor. “Sabe, amada, o melhor café que eu tomo na vida é o da casa da minha irmã em Vitória da Conquista. Quando eu chego lá no ônibus da meia-noite, ela sempre deixa uma garrafinha de café e uma pamonha quentinha me esperando.” Ao contar essa história, seus olhos se encheram de lágrimas. As pequenas gotinhas vieram e foram embora sem apagar o brilho e a garra estampados nos olhos de Dona Nilza.

Em seguida, hora de conhecer um local indicado para compra de licores, cocadas e geleias. Cheguei lá achando que conheceria uma simples lojinha, mas não foi isso que encontrei. Dona Dete, uma senhora muito humilde, com vestidinho rasgado e havaianas de solas gastas me recebeu calorosamente. Já foi logo pedindo desculpas por não ter muitas opções de geleias e também por oferecer quase tudo embalado em saquinhos e não em vidros. “O movimento está muito fraco nessa época de baixa”, se justificou. Ela me contou que quem embala e distribui seus produtos pelas pousadas da região são meninos carentes que nasceram em Santo André, mas que infelizmente não têm muitas oportunidades de estudo ou trabalho no vilarejo. Ela paga 10 ou 15 reais semanais pela ajuda. “É pouco, mas já é alguma coisa, não tem como eu dar mais que isso.” Ela contou feliz que está conseguindo ajudar regularmente dez meninos da região. Foi então que vi mais uma vez um par de olhos escuros como jabuticabas se encherem de água. Dona Dete ainda não está satisfeita, fica triste por ter de negar ajuda a outros garotos. “Corta meu coração quando vejo um menino que eu não pude ajudar se envolvendo com drogas. Depois que eles caem no vício, eu não posso fazer mais nada, não tenho mais como ajudar”. E para completar o projeto, ela só contrata garotos que estiverem matriculados na escola, sem faltar na aula.

São dois exemplos de mulheres fortes, que moram no meio do nada, não têm ajuda de ninguém, mas mesmo assim dedicam a vida a ajudar e atender as pessoas. Sentem satisfação em ver os outros contentes. Achei isso muito significativo. E, acredite, ambas fazem seu trabalho muito bem feito. Tanto o badejo fresquinho, assado na brasa e escoltado por purê de cenoura e polvo refogado da Dona Nilza, como as cocadas com pouco açúcar e muita fruta da Dona Dete valem a viagem.

Entardecer na balsa

Para chegar de Santa Cruz Cabrália a Santo André também é preciso fazer uma travessia de balsa. Dessa vez, o rio no meio do caminho é o João de Tiba.