Hoje o dia foi inspirador. Eu conheci duas mulheres impressionantes. Vi por duas vezes olhos se enchendo de lágrimas involuntariamente. Uma delas, dona de um restaurante simples, na beira da praia, nada além do fogão à lenha e algumas cadeirinhas. Por lá, não há energia elétrica, ou melhor “não tem eletricidade, porque energia e luz tem muita”. Quem comanda as panelas de barro e não deixa o fogareiro apagar é Dona Maria Nilza. Ela própria compra os peixes e camarões direto dos pescadores. Esse foi o primeiro lugar que visitei aqui na Bahia que não serve camarões nos meses de defeso. “Para fazer isso, só se eu congelasse por muito tempo e tudo que eu uso é fresco.” Dona Nilza me mostrou com calma cada cantinho do restaurante, até o banheiro. Tudo muito simples, mas decorado com carinho, com toalhas coloridas de chita e teto de sapé. Quando eu elogiei o cafezinho passado na hora no fogão à lenha e servido com açúcar mascavo, ela me disse que o segredo era fazer as coisas com amor. “Sabe, amada, o melhor café que eu tomo na vida é o da casa da minha irmã em Vitória da Conquista. Quando eu chego lá no ônibus da meia-noite, ela sempre deixa uma garrafinha de café e uma pamonha quentinha me esperando.” Ao contar essa história, seus olhos se encheram de lágrimas. As pequenas gotinhas vieram e foram embora sem apagar o brilho e a garra estampados nos olhos de Dona Nilza.
Em seguida, hora de conhecer um local indicado para compra de licores, cocadas e geleias. Cheguei lá achando que conheceria uma simples lojinha, mas não foi isso que encontrei. Dona Dete, uma senhora muito humilde, com vestidinho rasgado e havaianas de solas gastas me recebeu calorosamente. Já foi logo pedindo desculpas por não ter muitas opções de geleias e também por oferecer quase tudo embalado em saquinhos e não em vidros. “O movimento está muito fraco nessa época de baixa”, se justificou. Ela me contou que quem embala e distribui seus produtos pelas pousadas da região são meninos carentes que nasceram em Santo André, mas que infelizmente não têm muitas oportunidades de estudo ou trabalho no vilarejo. Ela paga 10 ou 15 reais semanais pela ajuda. “É pouco, mas já é alguma coisa, não tem como eu dar mais que isso.” Ela contou feliz que está conseguindo ajudar regularmente dez meninos da região. Foi então que vi mais uma vez um par de olhos escuros como jabuticabas se encherem de água. Dona Dete ainda não está satisfeita, fica triste por ter de negar ajuda a outros garotos. “Corta meu coração quando vejo um menino que eu não pude ajudar se envolvendo com drogas. Depois que eles caem no vício, eu não posso fazer mais nada, não tenho mais como ajudar”. E para completar o projeto, ela só contrata garotos que estiverem matriculados na escola, sem faltar na aula.
São dois exemplos de mulheres fortes, que moram no meio do nada, não têm ajuda de ninguém, mas mesmo assim dedicam a vida a ajudar e atender as pessoas. Sentem satisfação em ver os outros contentes. Achei isso muito significativo. E, acredite, ambas fazem seu trabalho muito bem feito. Tanto o badejo fresquinho, assado na brasa e escoltado por purê de cenoura e polvo refogado da Dona Nilza, como as cocadas com pouco açúcar e muita fruta da Dona Dete valem a viagem.
sábado, 23 de maio de 2009
Entardecer na balsa
sexta-feira, 22 de maio de 2009
Casamento de índio
Em Porto Seguro, eu visitei a Reserva Indígena da Jaqueira. Uma área de proteção ambiental que tem boa parte de seu território forrada com mata atlântica primária, ou seja, que nunca foi desmatada. Os índios da Jaqueira vivem parcialmente protegidos da cultura externa. Eles têm energia elétrica, mas só na escola; vivem em ocas, mas de alvenaria; usam roupas só no frio (pouco comum por aqui). O mais legal é que, nas aulas da escolinha, há tempo reservado para aprendizado do idioma dos pataxós. Mas, chegando ao ponto, toda essa introdução só para contar uma história que escutei por lá.
O que eles dizem na aldeia é que antigamente, quando um índio se interessava por uma índia, ele pegava uma pequena pedra do chão e atacava nela. Se ela jogasse uma pedra de volta ou agarrasse a que ele havia arremessado, era sinal de que também gostava dele. Algumas pedrinhas depois, o compromisso estava oficializado.
A data do casamento era marcada e toda a comunidade ajudava com os preparativos. Todos participavam da construção da casa, como uma forma de presentear a nova família. Quando a oca estava pronta, era hora de o noivo mostrar que era capaz de proteger sua futura esposa. Para isso, ele tinha de escalar uma montanha íngreme carregando um tronco de árvore que tivesse o mesmo peso da noiva. Se chegasse ao topo, provava que era capaz de socorrê-la em qualquer situação. Só então era realizada a cerimônia.
A união era oficializada com uma festa que reunia toda a aldeia. Os homens caçavam, as mulheres cozinhavam e todos dançavam para desejar felicidades ao casal. O casamento era para sempre, não havia como desfazê-lo (nada de anulação e muito menos divórcio) e nenhum dos dois poderia ser infiel.
Até hoje, uma vez por ano, casamentos como esse são realizados na Reserva Pataxó da Jaqueira.
O que eles dizem na aldeia é que antigamente, quando um índio se interessava por uma índia, ele pegava uma pequena pedra do chão e atacava nela. Se ela jogasse uma pedra de volta ou agarrasse a que ele havia arremessado, era sinal de que também gostava dele. Algumas pedrinhas depois, o compromisso estava oficializado.
A data do casamento era marcada e toda a comunidade ajudava com os preparativos. Todos participavam da construção da casa, como uma forma de presentear a nova família. Quando a oca estava pronta, era hora de o noivo mostrar que era capaz de proteger sua futura esposa. Para isso, ele tinha de escalar uma montanha íngreme carregando um tronco de árvore que tivesse o mesmo peso da noiva. Se chegasse ao topo, provava que era capaz de socorrê-la em qualquer situação. Só então era realizada a cerimônia.
A união era oficializada com uma festa que reunia toda a aldeia. Os homens caçavam, as mulheres cozinhavam e todos dançavam para desejar felicidades ao casal. O casamento era para sempre, não havia como desfazê-lo (nada de anulação e muito menos divórcio) e nenhum dos dois poderia ser infiel.
Até hoje, uma vez por ano, casamentos como esse são realizados na Reserva Pataxó da Jaqueira.
sexta-feira, 15 de maio de 2009
No balanço da balsa
quinta-feira, 14 de maio de 2009
Tartaruguinhas
Quem diria que as agitadas praias de Porto Seguro, com suas barracas gigantescas espalhadas por toda a orla, também são procuradas pelas tartarugas marinhas na época da desova. Pois acredite, elas são. Parece que os bichinhos não se importam muito com a bagunça e continuam aparecendo por aqui. O problema é que os ninhos ficam ainda mais ameaçados, agora também pelos turistas curiosos.
Eu visitei a sede de um pequeno projeto que trabalha em parceria com o Tamar. Eles protegem ninhos, ajudam as tartarugas recém-nascidas a voltar para o mar e resgatam as doentes para tratá-las. O mais legal é que todos que participam da ação são voluntários. Tive a oportunidade de ver uma família de tartaruguinhas que havia saído do ovo naquele mesmo dia. Elas estavam aguardando o movimento da praia diminuir para que pudessem ser levadas para o mar.
Dois fatos tristes:
- apenas uma ou duas tartarugas marinhas em cada mil chegam à idade adulta.
- muitas tartarugas morrem ou são encontradas doentes porque ingerem lixo jogado no mar. Os dois principais vilões são pedacinhos de isopor, muito utilizado pelos pescadores, e bitucas de cigarro.
Eu visitei a sede de um pequeno projeto que trabalha em parceria com o Tamar. Eles protegem ninhos, ajudam as tartarugas recém-nascidas a voltar para o mar e resgatam as doentes para tratá-las. O mais legal é que todos que participam da ação são voluntários. Tive a oportunidade de ver uma família de tartaruguinhas que havia saído do ovo naquele mesmo dia. Elas estavam aguardando o movimento da praia diminuir para que pudessem ser levadas para o mar.
Dois fatos tristes:
- apenas uma ou duas tartarugas marinhas em cada mil chegam à idade adulta.
- muitas tartarugas morrem ou são encontradas doentes porque ingerem lixo jogado no mar. Os dois principais vilões são pedacinhos de isopor, muito utilizado pelos pescadores, e bitucas de cigarro.
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Pelas vielas do centro histórico
A oportunidade que eu tive deve ser rara: passear pelas ruazinhas de terra do centro histórico de Porto Seguro sem mais do que 10 turistas no local. Eu explico: estamos em plena baixa temporada, ontem o dia estava nublado e as dezenas de ônibus da CVC que circulam pela cidade, largando e buscando pequenas multidões pelos locais mais turísticos, deve ter ficado na garagem.
Sem a bagunça, pude concluir que, apesar de já um pouco degradado e com um comércio de artesanato indígena-fake, o centrinho ainda mantém um certo charme. O local onde os portugueses construíram a primeira vilinha após o descobrimento é tombado pelo Iphan e, portanto, muito bem mantido. Destaque para as ruínas de um colégio dos jesuítas, o marco do Descobrimento e o Museu de Porto Seguro, que funciona na antiga Casa da Câmara e Cadeia.
O que eu descobri por lá é que, apesar da quantidade enorme de pessoas que desemboca direto dos ônibus para as ruelas da Cidade Alta, quase ninguém visita o museu. Vale ressaltar que a entrada custa simbólicos três reais (dois para estudantes). Então, fica a dica: caiu na cilada de estar no centro quando os monstros motorizados da CVC chegaram? Corre para o museu, faz uma horinha por lá e ainda aproveita a oportunidade para conhecer um acervo muito bem organizadinho.
Sem a bagunça, pude concluir que, apesar de já um pouco degradado e com um comércio de artesanato indígena-fake, o centrinho ainda mantém um certo charme. O local onde os portugueses construíram a primeira vilinha após o descobrimento é tombado pelo Iphan e, portanto, muito bem mantido. Destaque para as ruínas de um colégio dos jesuítas, o marco do Descobrimento e o Museu de Porto Seguro, que funciona na antiga Casa da Câmara e Cadeia.
O que eu descobri por lá é que, apesar da quantidade enorme de pessoas que desemboca direto dos ônibus para as ruelas da Cidade Alta, quase ninguém visita o museu. Vale ressaltar que a entrada custa simbólicos três reais (dois para estudantes). Então, fica a dica: caiu na cilada de estar no centro quando os monstros motorizados da CVC chegaram? Corre para o museu, faz uma horinha por lá e ainda aproveita a oportunidade para conhecer um acervo muito bem organizadinho.
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